sexta-feira, 29 de maio de 2009

PROMETEU E PANDORA (final)


Seguiu-se a Idade de Prata, inferior à de Ouro, porém melhor que a de Cobre, Júpiter (Zeus) reduziu a primavera e dividiu o ano em estações. Pela primeira vez o homem teve que sofrer os rigores do calor e do frio, e tornaram-se necessárias casas. As primeiras moradas foram as cavernas, os abrigos das árvores frondosas e cabanas feitas de hastes. tornou-se necessário plantar para colher. O agricultor teve de semear e de arar a terra, com ajuda do boi.

Veio, em seguida a Idade do Bronze, já mais agitada e sob a ameaça das armas, mas ainda não inteiramente má. A pior foi a Idade do Ferro. O crime inrrompeu, como uma inundação; a modéstia, a verdade e a honra fugiram, deixando em seus lugares a fraude e a astúcia, a violência e a insaciável cobiça. Os marinheiros estenderam as velas aos ventos e as árvores foram derrubadas nas montanhas para servir de quilhas dos navios e ultrajar a face do oceano. A terra, que até então fora cultivada em comum, começou a ser dividida entre possuídores. Os homens não se contentaram com o que produzia a superficie; escavou-se então a terra e tirou-se do seu seio os minérios e metais. Produziu-se o danoso ferro e o ainda mais danoso ouro. surgiu a guerra, utilizando-se de um e de outro como arma; o hóspede não se sentia em segurança em casa de seu amigo; os genros e sogros, os irmãos e irmãs, os maridos e mulheres não podiam confiar uns nos outros. Os filhos desejavam a morte dos pais, a fim de lhes herdarem as riquezas; o amor familiar aciu protado. A terra ficou úmida de sangue, e os deuses a abandonaram, um a um, até que ficou somente Astréia (Deusa da Inocência), que finalmente, acabou também partindo.

Vendo aquele estado de coisas, Júpiter (Zeus) indignou-se e convocou os deuses para um conselho. Todos obedeceram à convocação e tomaram o caminho do palácio do céu. Esse caminho pode ser visto por qualquer um nas noites claras, atravessando o céu, e é chamado de Via Láctea. Ao longo dele ficam os palácios dos deuses ilustres; a plebe celestial vive à parte, de um lado ou de outro.

Dirigindo-se à assembléia, Júpiter (Zeus) expôs as terríveis condições que reinavam na Terra e encerrou as suas palavras anunciando a intenção de destruir todos os seus habitantes e fazer surgir uma nova raça, diferente da primeira, que seria mais digna de viver e saberia cultuar os deuses. Assim dizendo, apoderou-se de um raio e já estava prestes a atirá-lo contra o mundo, destruindo pelo fogo, quando atentou para o perigo que o incêndio poderia acarretar para o próprio céu. Mudou, então, de idéia e resolveu inundar a terra. O vento norte, que espalha as nuvens, foi encadeado; o vento sul foi solto e em breve cobriu todo o céu com escuridão profunda. As nuvens, empurradas em bloco, romperam-se com fragor; torrentes de chuva caíram; as plantações inundaram-se; o trabalho de um ano do lavrador pereceu em uma hora. Não satisfeito com suas próprias águas, Júpiter (Zeus) pediu a ajuda de seu irmão Netuno (Poseidon). este soltou os rios e lançou-os sobre a terra. ao mesmo tempo sacudiu-a com um terremoto e lançou o refluxo do oceano sobre as praias. Rebanhos, animais, homens e casas foram engolidos e os templos, com seus recintos sacros profanos. Todos os edifícios que permanecera de pé foi submergido e suas torres ficaram abaixo das águas. Tudo se transformou em mar, num mar sem praias. aqui e ali, um indivíduo refugia-se num cume e alguns poucos, em barcos, apóiam o remo no mesmo solo que ainda há pouco o arado sulcara. Os peixes nadam sobre galhos das árvores; a âncora se prende num jardim. Onde recentemente os cordeirinhos brincavam, as focas cabriolam desajeitadamente. O lobo nada entre as ovelhas, os fulvos leões e os tigres lutam nas águas. A força do javali de nada lhe serve, nem a ligeireza do cervo. as aves tombam, cansadas, na água, não tendo encontrado terra onde pousar. Os seres vivos que a água poupara caem como presas da fome.

De todas as montanhas, apenas o Parnaso ultrapassa as águas. Ali, Deucalião e sua esposa Pirra, da raça de Prometeu, encontraram refúgio _ ele é um homem justo, ela, uma devota fiel dos deuses. Vendo que não havia outro ser vivente além do casal, e lembrando-se de sua vida inofensiva e de sua conduta piedosa, Júpiter (Zeus) ordenou aos ventos do norte que afastassem as nuvens e mostrassem o céu à terra e a terra ao céu. Também Netuno (Poseidon) ordenou a Tritão que soasse sua concha determinando a retirada das águas. As águas obedeceram; o mar voltou às suas costas e os rios, aos seus leitos. Deucalião assim se dirigiu, então, a Pirra: "Ó esposa, única mulher sobrevivente, unida a mim primeiramente pelos laços do parentesco e do casamento, e agora por um perigo comum, pudéssemos nós possuir o poder de nosso antepassado Prometeu e renovar a raça, como ele fez, pela primeira vez! Como não podemos, porém, dirijamo-nos àquele templo e indaguemos dos deuses o que nos resta fazer." Entraram num templo coberto de lama e aproximaram-se do altar, onde nenhum fogo crepitava. Prostraram-se na terra e rogaram à deusa que os esclarecesse sobre a maneira de se comportar naquela situação miserável. "Saí do templo com a cabeça coberta e as vestes desatadas e atirai para trás os ossos de vossa mãe" _ respondeu o oráculo. Estas palavras foram ouvidas com assombro. Pirra foi a primeira a romper o silêncio. "Não podemos obedecer; não vamops nos atrever a profanar os restos de nossos pais." Seguiram pela fraca sombra do bosque, refletindo sobre o oráculo. Afinal, Deucalião falou: "Se minha sagacidade não me ilude, poderemos obedecer à ordem sem cometermos qualquer impiedade. A terra è a mãe comum de nós todos; as pedras são seus ossos; poderemos lançá-las para trás de nós; e creio ser isso que o oráculo quis dizer. Pelo menos, não fará mal tentar." Os dois velaram o rosto, afrouxaram as vestes, apanharam as pedras e atiraram-nas para trás. as pedras (maravilha das maravilhas!) amoleceram e começaram a tomar forma. Pouco a pouco, foram assumindo uma grosseira semelhança com a forma humana, como um bloco ainda mal acabado nas mãos de um escultor. A umidade e o lodo que havia sobre elas transformaram-se em carne; a parte pétrea transformou-se nos ossos; as veias ou veios da pedra continuaram veias, conservando seu nome e apenas mudando sua utilidade. as pedras lançadas pelas mãos do homem tornaram-se homens, as lançadas pela mulher tornaram-se mulheres. era uma raça forte e bem disposta para o trabalho como até hoje somos, mostrando bem nossa origem.

fonte: O Livro de Ouro da Mitologia - Thomas Bulfinch

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